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“FAZ PARTE...”

  • Foto do escritor: Fernando Polignano
    Fernando Polignano
  • 9 de fev. de 2022
  • 3 min de leitura

Atualizado: 17 de fev. de 2022

Eu acho estranha essa expressão - “Faz Parte”. Será que estamos deixando ser enfiado goela abaixo algo que não desejamos, não queremos? Como anda a nossa atenção com as escolhas que fazemos? Ou nem estamos avaliando pra escolher?

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Mascarado e usando luvas percorro o supermercado, no horário mais vazio que encontro nesta quarta-feira. São 14h30 e poucas pessoas circulam, cada uma se portando de acordo com seu nível de informação e juízo. Nada a declarar, cada um sabe de si. Escolho agora tomates e, ao meu lado, noto duas jovens que selecionam batatas. Não tenho como não perceber algo da conversa, mas é uma expressão o que me chama e faz fixar minha atenção no diálogo. Ela diz à amiga: “Sabe como é... faz parte...”. A jovem que disse dá a típica arrumada de lado no cabelo longo e olha a outra. Pelo tom, talvez, sob a máscara, ela tenha a boca contraída, virada para baixo, numa expressão de desagrado. Talvez.


A expressão ‘Faz parte...’ é mais uma das largamente incorporadas ao linguajar nosso de todo dia, e observo que tem um caráter de representar algo como uma ‘aceitação passiva de algo que é mais forte ou mais poderoso do que eu’; mesclada com ‘uma justificativa para não agir mais, porque não adianta’. Eu acho estranha essa expressão e o seu uso nesse sentido. Me remete a ‘engolir em seco o bombril’, a deixar ser enfiado goela abaixo algo que não se deseja, algo que não se aprecia, não se quer. Algo que não é ‘a minha escolha’. Ora, então, por que aceitar?


Pode virar um tratado a reflexão sobre isso e, sim, inumeráveis, lícitos e reais podem ser os muitos motivos que respondem a essa pergunta - ‘Por que aceitar o que não é a minha escolha?’. É claro que há situações em que a batalha não vale, uma discussão seria inútil ou mesmo desastrosa, os riscos são altos, a necessidade obriga, enfim, há motivos. Entretanto, pessoas são igualmente hábeis em sair fora do campo de ação, do posicionar-se e definir um território próprio, não é difícil encontrar uma ‘explicação’ qualquer e safar-se para fora do agir, e fazer isso até com alguma elegância às vezes. Os álibis podem ser apresentados com inteligência e de forma coerente, com todo um arrazoado, provas e exemplos de ‘porque não adianta’...


Enquanto reflito sobre isso, me dou conta dos tomates que estou escolhendo. Olho as jovens e as vejo também selecionando suas batatas. Há escolhas, sempre. Comprar alimentos num supermercado durante uma pandemia também tem seus riscos – aliás, viver é sempre arriscado! E nem as jovens, e nem eu mesmo, estamos deixando de selecionar os melhores tomates e batatas. Não pegamos qualquer um, sem prestar atenção. Valem dinheiro, devem servir para nos alimentar, nós avaliamos a aparência, observamos se possuem marcas ou se estão amassados, ou seja, não é qualquer tomate ou batata que ‘vai fazer parte’.


As jovens se afastam e eu sigo nas compras e com meus pensamentos. Lembro de minha avó mineira que na sua objetiva simplicidade me dava lições: “Não se gasta vela com defunto ruim.” Fui entendendo o que ela queria dizer, e as vivências me ensinaram a dar o meu tempo e a minha atenção, a oferecer o meu melhor, e também a receber algo ou aturar alguma situação, avaliando que tipo e qualidade de contribuição trazem. Assim também como procuro observar o que eu mesmo estou oferecendo ao mundo à minha volta, às pessoas com as quais convivo no cotidiano, no trabalho. E vejo que, para muita gente, o desagradável, o indesejável, o incorreto, o que até pode ser prejudicial, é muitas vezes aceito sob a justificativa de que ‘faz parte’.


Mas eu proponho a pergunta: Precisa mesmo fazer parte? OU posso escolher outro posicionamento para mim? Há saídas que posso usar? Qual é a minha real capacidade de gerar alternativas mais coerentes e afins com os meus valores, meu propósito, com meu jeito de ser, o meu querer? Essas são questões que mais e mais tenho me feito, e tenho também incentivado outras pessoas a se fazerem, tanto quando estou trabalhando como nas interações do dia a dia. Provocar é um verbo interessante, se bem usado, isso tenho aprendido também. E é isso que, para mim, faz parte, porque tem sentido e é uma escolha minha.


O Ser do humano me fascina.



Fernando Polignano atua na área de Desenvolvimento Humano, de Estratégias de Liderança e Relacionamento.

 
 
 

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